Memorial da Resistência de São Paulo inaugura exposição “Mulheres em Luta!”

Mulheres em Luta
Cartaz da Exposição à direita. À esquerda, Inês Etienne Romeu durante julgamento na 3ª Auditoria do Exército, 1979 – CRÉDITO ACERVO APESP

De histórias de vida fraturadas pela dor a redes de afeto construídas na resistência, mostra é um ato de memória à força política feminina

O Memorial da Resistência de São Paulo, museu da Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo, recebe até julho de 2024 a exposição “Mulheres em Luta! Arquivos de Memória Política”, com curadoria de Ana Pato. Tendo o acervo de história oral do museu como fio condutor, a mostra apresenta um olhar a partir da perspectiva de gênero para a Ditadura Civil-Militar e como as marcas profundas deste período se entrelaçam com o presente.

A exposição ressalta as lutas coletivas de mulheres, a partir de dois eixos: a Luta por Memória, Verdade e Justiça e a Luta por Direitos. Entre os destaques, está a série “Conhecendo o Corpo Feminino” (1984), de Nair Benedicto, que também ocupa o mural externo do museu. Exibido pela primeira vez no Brasil nesta exposição, o filme “Inês” (1974), da atriz e cineasta feminista Delphine Seyrig (1932-1990), é um importante documento histórico que denuncia a misoginia praticada pelos agentes do Estado durante a ditadura. Poemas escritos por Beatriz Nascimento (1942-1995) nos anos 1980 sobre resistência, violência, racismo e impunidade, também fazem parte da mostra.

Na abertura, os coletivos Movimento de Familiares das Vítimas do Massacre em Paraisópolis, Mães da Leste e Mães de Osasco/Barueri e o Movimento Periferia Segue Sangrando organizam uma intervenção cultural no museu a partir das 10h.

Luta por Memória, Verdade e Justiça

Das muitas experiências de resistência, dor e afeto que atravessam a trajetória das mulheres que compõem a Coleção Memórias da Ditadura Civil-Militar do acervo do Memorial da Resistência, estão as greves nas fábricas, a maternidade na clandestinidade, o machismo da própria esquerda e a homofobia, que foram alguns dos desafios enfrentados quando consideramos o recorte de gênero. Também o ódio ao corpo feminino, as violências sexuais, a solidariedade nas celas das prisões e o compromisso com a vida que prevaleceram e permitiram que os relatos das sobreviventes e ex-presas políticas chegassem até nós. Estes testemunhos são materializados na instalação “Partitura da Escuta” (2023), de Bianca Turner, no início da exposição.

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Entre as narrativas, destacam-se histórias como a de Inês Etienne Romeu, presa política e única sobrevivente do centro clandestino de tortura da ditadura conhecido como Casa da Morte, em Petrópolis (RJ). Sua coragem de enfrentar as violências que sofreu do Estado ganhou notoriedade internacional e é contada em forma de denúncia no filme “Inês” (1974), de Delphine Seyrig. O curta brutal que desencadeou um amplo movimento internacional pela liberdade de Inês e pertence hoje ao acervo do Centre Audiovisuel Simone de Beauvoir, em Paris, será exibido pela primeira vez no Brasil durante a exposição.

A história de Inês se conecta com Heleny Guariba, dada como desaparecida política até hoje após ser presa e torturada na Casa da Morte. O curta de animação “Cadê Heleny?” (2022), de Esther Vital, tem sessão única no dia 7 de outubro, às 14h. Os bordados que compõem os cenários, figurinos e personagens do filme foram criados por uma equipe de mulheres em oficinas de arpilleras ocorridas em 2018 no museu, e estão presentes na exposição.

As formas de repressão e luta que cercavam as mulheres durante a Ditadura Civil-Militar (1964-1985) não cessaram com o fim do regime. A série audiovisual “Do luto à luta” (2023), dirigida por Val Gomes, reúne testemunhos da Coleção Memórias da Violência na Democracia do acervo do museu, com integrantes dos coletivos Mães da Leste, Movimento de Familiares de Vítimas do Massacre de Paraisópolis e Mães de Osasco/Barueri.

INÊS ETIENNE ROMEU – CRÉDITO ACERVO APESP
Clube de Mães da Zona Sul, 1º Encontro Vila São Remo, 1982 – CRÉDITOS CEDEM UNESP

Luta por Direitos

A luta por memória, verdade e justiça se combina à busca por direitos fundamentais e amplos, ganhando força a partir de meados da década de 1970 e durante a redemocratização. Demandas por saúde, educação e moradia digna encontram as pautas feministas e inspiram a luta das mulheres até hoje.

A série fotográfica “Conhecendo o Corpo Feminino” (1984), de Nair Benedicto, abre este eixo da exposição. Nair produziu um importante registro visual de encontros e atividades de organizações feministas em São Paulo dedicadas a discutir gênero, saúde, sexualidade e corpo feminino no contexto da época. Os poemas da historiadora, poeta e militante negra Beatriz Nascimento escritos nos anos 1980 perpassam os dois eixos e também simbolizam como as lutas convergem e continuam.

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A mostra exalta exemplos como o das integrantes dos Clubes de Mães da Zona Sul por demandas de saúde, educação e moradia digna, da militância feminista da União de Mulheres de São Paulo, das Promotoras Legais Populares, de Laudelina de Campos Mello, em defesa das trabalhadoras domésticas, e de organizações como o IN.FORMAR, criado para apoiar e documentar movimentos sociais.

A Escola de Testemunhos, do Grupo Contrafilé, e os percursos de memória mediados pelo Acervo Bajubá, em torno das ações do coletivo Mulheres da Luz e das experiências das comunidades LGBT+ em defesa de suas identidades e sexualidades também nos conectam com essas lutas que permanecem vivas e implacáveis.

Serviço:

“Mulheres em Luta! Arquivos de Memória Política”

Visitação gratuita até 27 de julho de 2024, de quarta a segunda, das 10h às 18h

Memorial da Resistência de São Paulo – Largo General Osório, 66 – Santa Ifigênia

Classificação etária: 12 anos

Os ingressos do Memorial estão disponíveis no site e na bilheteria do prédio. Reservas pelo link https://memorialdaresistencia.byinti.com/#/ticket/