“Pastrana – A Mulher Mais Feia do Mundo” estreia temporada gratuita no Teatro Gonzaguinha, Rio de Janeiro

Cena da peça “Pastrana – A Mulher Mais Feia do Mundo”
“Pastrana” pretende provocar reflexão sobre a necessidade de se construírem novas narrativas sobre corpos divergentes – Crédito: RMNZ

Trazendo reflexões sobre questões de gênero, feminilidades, exclusão de corpos fora do padrão, empoderamento e objetificação, projeto inclui oficinas e debates

Quando o assunto é o corpo, sobretudo o da mulher, conceitos como visibilidade e exploração confundem-se e causam dor. O antigo circo de horrores em que mulheres barbadas tinham seus corpos explorados para escárnio popular não está longe das agressões e das zombarias que ocorrem hoje nas redes sociais.

Seriam as mídias digitais novas versões dos circos de horrores? Reflexões como essa conduzem o espetáculo “Pastrana – A Mulher Mais Feia do Mundo”, que estreia gratuitamente no dia 20 de outubro (quinta), às 19h, no Teatro Gonzaguinha, no Centro do Rio de Janeiro (RJ).

A peça, que tem direção de Carolina Caju para a dramaturgia elaborada por Clarisse Zarvos, integra o projeto itinerante que inclui também oficinas e debates e que foi aprovado no edital de Fomento à Cultura Carioca (Foca) 2021, da Secretaria Municipal de Cultura.

Numa noite mágica, o circo Blasfêmia chega do futuro com suas estranhas e maravilhosas atrações. Após uma explosão que transforma as leis do tempo, o circo passa a homenagear uma antiga integrante, Julia Pastrana, uma talentosa artista indígena mexicana que, nascida no século 19, não pôde contar sua história por causa de sua aparência. Julia tinha o corpo todo coberto de pelos, e por isso sua atuação ficou restrita aos antigos shows de horrores. Agora, as atrizes do presente imaginam novos rumos para Pastrana e outras artistas fora do padrão de todas as épocas, trocando o sombrio palco dos freak shows pelo potente mundo dos freak sonhos.

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“A vivência de Julia nos freak shows da época foi o que deu origem ao famoso número circense da Monga, em que uma mulher se transforma em gorila e ataca a plateia. Mas isso é muito pouco para resumir Julia Pastrana, que era uma artista incrível: dançava, cantava, tinha inúmeras habilidades e vários talentos. Ela merece que sua história seja contada por um ponto de vista mais amplo, humano e afetuoso. Uma pergunta que fazemos é: como seria a história de Julia contada nos dias de hoje?”, provoca Carolina.

Para Desirée Santos, codiretora da montagem, “é essencial recontar histórias que foram estigmatizadas e redesenhar narrativas que foram violentadas pela humanidade. Julia Pastrana teve sua imagem explorada, sua história apagada de tal modo que seu corpo de maneira póstuma ainda estava sendo animalizado. Projetar o olhar criticamente para essa história é apontar que vivemos sob perspectivas da crueldade”, destaca.

No perfil da peça no Instagram (@pastranapeca) serão transmitidas três palestras em formato de live, debatendo a interseção entre artes da cena, circo, teatro e mídias digitais. A montagem pretende provocar reflexão sobre a necessidade de se construírem novas narrativas sobre corpos divergentes. E que essas histórias sejam cada vez mais contadas pelo ponto de vista de quem as vive, ocupando espaços públicos, recebendo fomento para que suas pesquisas e estéticas sejam vistas e ouvidas.

“A ideia do espetáculo surgiu de uma inquietação causada por experiências vividas por mim e por pessoas próximas. Me dei conta de que, apesar das muitas diferenças que individualizam as vivências dos corpos divergentes, há um ponto que infelizmente nos une: a objetificação desses corpos traduzida em abusos dos mais diversos. Mulheres brancas ou negras, cis ou trans, pessoas indígenas, negras, LGBTQIAP+, PCDs em maior ou menor grau, têm seus direitos violados e seus corpos violentados. A descoberta da história da Julia Pastrana só fez confirmar essa reflexão e representa uma espécie de alegoria que nos provoca a pensar o que de fato é ser estranho numa sociedade tão adoecida”, finaliza Carolina.

Quem foi Julia Pastrana

Julia Pastrana foi uma mulher indígena mexicana que viveu no século 19 e ficou famosa apenas por sua condição, a hipertricose – pelos em demasia pelo corpo todo. Ela era portadora de diversas síndromes e tinha também orelhas e gengivas protuberantes.

Aos 20 anos, conhecida como “mulher mais feia do mundo”, foi levada para os Estados Unidos para ser estudada por especialistas norte-americanos e noruegueses. Mas continuou sendo exibida como uma anomalia da natureza e atração em circos de horrores nos Estados Unidos e na Europa.

Era uma pessoa sensível, muito feminina e tinha inteligência acima da média, sendo fluente em três idiomas. Mesmo depois de morta, Julia Pastrana continuou sendo atração na Universidade de Oslo, na Noruega, onde seu corpo mumificado ficava exposto. Só em 2013, o governo do México, finalmente, conseguiu levar o corpo dela para a terra natal.

Serviço:

“Pastrana – A Mulher Mais Feia do Mundo”

De 20 de outubro a 11 de novembro, de quinta a sábado, às 19h

Teatro Gonzaguinha – Centro de Artes Calouste Gulbenkian

Rua Benedito Hipólito, 125 – Centro – Rio de Janeiro

Entrada gratuita – Classificação indicativa: 14 anos

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