Exposição de artistas mulheres propõe reflexão sobre o feminino e o lugar do bordado na arte

Exposição de artistas mulheres propõe reflexão sobre o feminino e o lugar do bordado na arte
Obras de SONIA GOMES / CRÉDITO CORTESIA DA ARTISTA E MENDES WOOD DM e LEDA CATUNDA / CRÉDITO DING MUSA

“Andar pelas bordas: bordado e gênero como práticas de cuidado” tem curadoria de Lilia Moritz Schwarcz e reúne 53 trabalhos de 47 artistas mulheres

A mostra “Andar pelas bordas: bordado e gênero como práticas de cuidado” oferece um amplo panorama da produção artística em bordado, a partir da obra de 41 artistas mulheres e seis coletivos de bordadeiras. Com curadoria da antropóloga e historiadora Lilia Moritz Schwarcz, a ideia é explorar várias potencialidades estéticas e políticas do bordado.

A mostra também pretende desnaturalizar a associação entre trabalho feminino e a técnica, desmistificando o caráter supostamente “naïf”, historicamente vinculado ao ato da costura.

A exposição está em cartaz na Arte132, em São Paulo, desde o dia 26 de agosto e segue aberta à visitação gratuita até 21 de outubro.

A curadoria selecionou artistas de diferentes contextos, gerações, raças e regiões para mostrar a importância do bordado na história da arte brasileira. Entre os trabalhos, estão desde uma tapeçaria feita pela carioca Madalena dos Santos Reinbolt (1919-1977), artista negra que ganhou recentemente importante retrospectiva no Masp (Museu de Arte Assis Chateaubriand) em 2022, a uma obra da série Livro/Objetos (“Ponto a Ponto”) da veterana Anna Maria Maiolino, bem como trabalhos de artistas mais jovens como Vivian Caccuri e Rebeca Carapiá.

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Segundo Lilia, a exposição busca “atravessar definições por demais assentadas na história das artes, como retomar o tema do gênero, em geral associado à prática de maneira conservadora – vinculando-o ao espaço exclusivo da domesticidade – mas de forma nada convencional”. Schwarcz mostra como “o bordado serve ao afeto, à estética, como se presta ao campo das reivindicações políticas e sociais por direitos”.

Nesta perspectiva, algumas obras destacam-se por seu inegável caráter político, como a da artista Lívia Aquino, “2720. Viva Maria” (que tem a palavra “Canalhas” bordada em feltro sobre bandeira de tecido), inspirada em um trabalho do concretista Waldemar Cordeiro (1925-1973). “Cada conta, um rio…”, de Hariel Revignet, mostra símbolos de culturas de matriz afro-brasileira, permeados por temas como religiosidade, pertencimento e identidade em uma obra feita com acrílica sobre tela com costura de guias de Lágrimas de Nossa Senhora.

“Andar pelas Bordas” tem como objetivo inverter hierarquias muito consagradas no mundo das artes, que implicam classificações de gêneros artísticos rígidas, e uma divisão que privilegia as produções masculinas em detrimento das femininas.

A mostra também questiona estereótipos que marcam o ofício do bordado, bem como a atuação de suas integrantes, ao trazer coletivos que têm ressignificado o ato tradicional de bordar, para discutir seu significado que “se refere a práticas ancestrais, em que a comunidade defende, acolhe, se protege e se identifica a partir do bordado”, destaca a curadora, citando a pesquisadora Julia Bryan-Wilson.

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Ao percorrer a história do bordado no Brasil, a mostra se depara com questões sociais e políticas, como o protagonismo das mulheres na tecelagem, levando em consideração um dado levantado em 2022 pela ONU Mulheres que revela que, no país, dos mais de um milhão de profissionais de costura, 87% deles são mulheres.

A exposição busca desvincular da profissão do bordado o preconceito arraigado, como se essa fosse uma atividade exclusivamente doméstica e da domesticidade; para esse contraponto, a curadora propõe o bordado como forma de expressão, reivindicação e luta.

A exposição é dedicada a Telmo Porto, idealizador e diretor da Arte132 Galeria, recentemente falecido e que acompanhou todo o processo de realização de “Andar pelas bordas”. A exposição é também dedicada às mulheres artistas durante tanto tempo afastadas do cânone das artes brasileiras.

Serviço:

“Andar pelas bordas: bordado e gênero como práticas de cuidado”

Visitação gratuita de 26 de agosto a 21 de outubro; de segunda a sexta, das 14h às 19h e aos sábados, das 11h às 17h

Arte132 Galeria – Avenida Juriti, 132, Moema, São Paulo/SP

Informações: https://arte132.com.br